Do êxtase procura ter o olhar como espaço de foco entre os três intérpretes, na medida em que se procura a contemplação, mas não o consumo do que é observado. Esta contemplação é sobre deixar o ser contemplado livre, mas conduzi-lo e ajudá-lo a construir-se, é sobre aprender a mediar os corpos, os movimentos, os puros devaneios necessários. Reflete o momento que se cria até pousar os olhos no outro, é o prazer de se demorar desinteressadamente nessa contemplação, não porque a negligência, mas porque cria o desprendimento necessário para aprender a deixá-la e ainda sim conseguir senti-la. Percebe-se deste modo, que a contemplação convida à demora, à vontade, à necessidade de pousar o olhar. Por momentos, contemplar o outro é desprender-se de si mesmo.
Será a contemplação suficiente para a criação de arquivo? Onde fica a autenticidade e o real após o acontecimento? Para a memória perdemos espaço, corpo, sonoridade, para o arquivo duplicamos a imagem ou triplicamos, será este um arquivo em tríptico ao mesmo tempo que se ausenta de si mesmo, reflete-se nos outros. Seremos em tríptico para que se criem as extremidades e se encontre um núcleo flutuante. Será levar a público esta dicotomia de memória e arquivo, num espaço de registo da contemplação.
A par desta contemplação também ela finita encontram-se os três corpos em conversação verbal e corporal, onde a construção da beleza é também a alusão do desastre, que segundo Byung-Chul Han mais não é do que “(…) a morte do sujeito autoerótico, que se agarra a si mesmo.”
Este êxtase leva ao desejo pela contemplação, pelo corpo, pela existência por via do desastre, há assim um desejo que se reflete numa tentativa de despojar o corpo dos seus movimentos, das suas vestes “para o fazer existir como pura carne; é uma tentativa de encarnação do corpo do outro.” (citando Giorgio Agamben).
Ficha Técnica:
Direção artística| Mélanie Ferreira e Tiago Vieira
Encenação| Tiago Vieira
Interpretação| Bruno Simão, Mélanie Ferreira e Tiago Vieira
Cenografia, figurinos, som e luz| Tiago Vieira
Registo fotográfico e de vídeo e vídeo de cena| Bruno Simão
Produção| Mélanie Ferreira e Self-Mistake
Apoio à criação| Self-mistake e Fundação GDA
Apoio a Residências Artísticas| Latoaria (Lisboa), c.e.m. (Lisboa), Estúdio Vitor Cordon (Lisboa), Oficinas do Convento (Montemor-o-novo)
- Música e Performance